11.6.10

Começa hoje a primeira Copa da África. Começa hoje a 19ª Copa da Fifa. Por 31 dias, o futebol viverá a contradição entre as peculiaridades africanas e o modelo padrão da dona do Mundial.
O ponto de partida é a estreia da África do Sul diante do México, às 11h, no Soccer City, não por acaso localizado em Soweto, foco maior da resistência ao apartheid.
A Copa da África é dominada pelo público local: responderá por 80% dos torcedores, a maioria com ingressos baratos. Muitos obtidos após a Fifa render-se à realidade do país, com 50% da população abaixo da linha de pobreza, e reduzir preços.
Outra barbeiragem, tardiamente corrigida, foi confiar demais nas vendas on-line, como se a África do Sul, com 8% da população conectada à internet, fosse a Alemanha.
A Copa da Fifa era planejada para ter 500 mil estrangeiros, boa parte em pacotes luxuosos. A crise financeira, o medo da violência e os preços altos reduziram o número a menos de 400 mil.
A Copa da África é a renovação da paixão do torcedor local pela sua desmoralizada seleção. Um mar de camisas amarelas saudou os Bafana Bafana (apelido da seleção) no bairro rico (e majoritariamente branco) de Sandton.
Para receber o evento, o país teve de se submeter a uma série de regras que desagradaram a muitos sul-africanos. Um preço que aceitou pagar para mostrar ao mundo uma África do Sul madura e com democracia racial.
Nada foi mais polêmico do que a aceitação da primazia dos patrocinadores da promotora do evento. A Copa da Fifa é, por exemplo, a ocupação da praça de um shopping pelo estande da Sony, que dificulta a circulação do povo.
Mais barulhenta ainda foi a proibição de que trabalhadores informais continuassem vendendo seus produtos em "zonas de exclusão", num país em que esse setor representa 15% da economia.
A Copa representa gasto de R$ 8 bilhões do governo para estádios, alguns fortes candidatos a elefantes brancos. Representa ainda a entrega de arenas de primeira linha a tempo do evento.
A Copa da África são seus cantores que participaram do concerto de abertura após protesto por terem ficado de fora. A da Fifa iria pouco além da popstar Shakira.
A Copa da África é Muntari, Mokoena, Drogba (ainda), é Eto'o. É também Maradona, que não se enquadra no script da Fifa e volta ao Mundial 16 anos depois.
A Copa da Fifa é Messi, Kaká e Cristiano Ronaldo, estrelas que a ajudam a se expandir pelo mundo. E que contribuíram para que ela tenha um aumento de 50% de suas receitas neste Mundial em relação à Alemanha -ganhou US$ 1 bilhão só em 2009.
Com a ajuda da África pobre, a Fifa é bilionária.

Da ˙Copa do contraste˙, de Fábio Zanini e Rodrigo Mattos para a Folha.

1 comment:

Lívia Corbellari said...

e a maioria das pessoas acha q a copa so traz coisas boas pro pais =/